STJ: Plano de saúde não pode recusar tratamento com base em uso off label de medicamento
10 de setembro de 2018Atrasos no desenvolvimento da fala: como notar e contornar
10 de setembro de 2018Imagine as duas faces de uma moeda. É como funcionam a insulina e a amilina no organismo. Ambas são produzidas pelas células beta no pâncreas
e trabalham numa espécie de parceria no que diz respeito ao metabolismo dos carboidratos. A insulina permite que o açúcar que está presente no sangue penetre nas células para ser utilizado como fonte de energia. Se esse hormônio falta ou não funciona corretamente, haverá aumento de glicose no sangue, que é o diabetes. A amilina, por sua vez, é o “hormônio parceiro” que envia sinais de saciedade ao cérebro, para que ninguém coma sem parar, assim como retarda o esvaziamento gástrico do estômago, para evitar a ingestão excessiva de calorias – do contrário, não haveria insulina que desse conta de tanto açúcar!
Paulo Lacativa, mestre e doutor em endocrinologia pela UFRJ: membro da equipe que desenvolveu o BZ043 (Foto: Acervo pessoal)
No entanto, apesar dessa complementaridade, o tratamento para o controle do diabetes se vale apenas da reposição de insulina, deixando de lado a reposição da amilina. E por quê? Quem explica é o médico e pesquisador Paulo Lacativa, mestre e doutor em endocrinologia pela UFRJ. “A grande dificuldade sempre foi desenvolver um medicamento à base de amilina humana, que é bastante insolúvel. Em poucos segundos, ela começa a se aglomerar e vira algo parecido com uma bolota. Por isso, já houve uma tentativa de pôr um produto análogo no mercado, conhecido como pramlintide, nos EUA e na Europa. Entretanto, seu uso não era o que se poderia chamar de amigável para o paciente. A amilina tinha que ser administrada separadamente da insulina, o que significava até sete picadas por dia. Sem contar que usar as drogas de forma independente resultava num desbalanceamento difícil de equilibrar”, diz.
Ele afirma que o grande desafio é o que os médicos chamam de repor a fisiologia do paciente: “é o equivalente a restaurar um estado de saúde. Um exemplo simples é o indivíduo com hipotireoidismo, que deixa de produzir o hormônio necessário. No entanto, basta que seja feita a reposição com a dose correta para ele se comportar como alguém saudável. O mesmo não acontece com o paciente diabético, porque ele se desestabiliza facilmente. O simples uso de insulina não permite que se comporte como as pessoas sem a doença, e sua reposição intensiva causa aumento do peso e risco de hipoglicemia. Portanto, tratar os pacientes com insulina e amilina seria o caminho para uma maior estabilidade fisiológica”.
A ótima notícia é que essa situação está em vias de mudar, graças ao trabalho da equipe do pesquisador. Os estudos começaram no laboratório da UFRJ, sob o comando do professor Luís Maurício Lima, e se tornaram tão promissores que foi criada uma startup que conta com o financiamento de um fundo de investimentos para ciência de ponta, do qual participam BNDES e Finep, entre outros. “Foram duas grandes descobertas”, afirma o doutor Lacativa. “A primeira é poder usar a amilina humana. A segunda é conseguir colocar a amilina e a insulina juntas, de forma que a aplicação seja única. Existem vários tipos de insulina sintética, que imitam a ação do hormônio natural do corpo, e não haverá incompatibilidade com nenhuma delas”, completa.
O futuro medicamento foi batizado como BZ043 e será mais uma boa nova na XXXIII Reunião Anual da FeSBE (Federação de Sociedades de Biologia Experimental), que se encerra hoje em Campos de Jordão. A próxima fase será a de realização de estudos com função regulatória. Segundo o doutor Lacativa, os testes com humanos serão feitos em cerca de seis meses e a expectativa é de a medicação estar disponível no mercado em três ou quatro anos. De acordo com o portal da Fiocruz, os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 16 milhões de brasileiros sofrem de diabetes, e a taxa de incidência da doença cresceu 61,8% nos últimos dez anos. O Rio de Janeiro aparece como a capital brasileira com maior prevalência de diagnóstico médico da doença, com 10.4 casos a cada 100 mil habitantes. O diabetes é uma epidemia global e o Brasil ocupa o 4º lugar no ranking dos países com o maior número de casos, atrás de China, Índia e Estados Unidos.