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7 de agosto de 2023LEI 14624/ Fita Girassol
8 de agosto de 2023Decisão reconhece que plano de saúde tem obrigação de cirurgia robótica negada a paciente idoso e com câncer de próstata.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já firmou o entendimento pacífico de que a operadora de saúde, ao oferecer cobertura para determinada patologia, está obrigada a arcar com todos os custos decorrentes da terapia mais adequada para o segurado, desde que expressamente recomenda por seu médico. 1
Não bastasse esse posicionamento, é certo que as diretrizes de utilização previstas pela Agência Nacional de Saúde (ANS) servem de mero parâmetro para as operadoras de planos de saúde, jamais se sobrepõem à prescrição e orientação do médico-assistente, que é quem acompanha direta e pessoalmente o paciente.
Destarte, com a edição da lei 14.454/22, o rol de procedimentos básico da ANS passou a ser, oficialmente, considerado como exemplificativo, de forma que apresenta apenas o mínimo de cobertura a ser garantido. Assim, os planos de saúde estão obrigados a oferecer cobertura de exames ou tratamentos, mesmo os que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, desde que remetam a doenças que estão cobertas por contrato.
Assim, temos que se o contrato assinado entre as partes estabeleceu a cobertura para uma determinada doença, não caberia ao plano de saúde restringir ou limitar qualquer forma de tratamento. Cabe exclusivamente ao médico, responsável e habilitado para o tratamento do paciente, indicar qual a melhor opção de tratamento, não cabendo ao plano de saúde opinar a respeito dos procedimentos indicados, mas tão somente delimitar as doenças que terão cobertura.2 Caso contrário, todo o tratamento seria guiado pelo plano, e não pelo profissional médico, o que não faria qualquer sentido.
Nesse sentido, qualquer ação do plano de saúde que vise rejeitar eventual prescrição terapêutica ou cirúrgica recomendada pelo médico ao paciente segurado é manifestamente ilegal e abusiva, e afrontaria o Código de Defesa do Consumidor (CDC; art. 6º, V e VI; 47; 51, IV, X, XIII e XV; 54, caput; e 84).
Em casos semelhantes, inclusive, já houve posicionamento do Tribunal de Justiça de Pernambuco no sentido de determinar às operadoras de planos de saúde a concessão do tratamento com cirurgia robótica ao invés da convencional, quando expressamente indicado pelo médico que acompanha o paciente.3
Com base nessas premissas, o magistrado da Seção B da 19ª Vara Cível do Recife determinou que o plano de saúde forneça, em até 48 (quarenta e oito) horas, a cirurgia robótica necessária para um segurado portador de câncer de próstata, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
No caso em comento, o magistrado compreendeu a gravidade da situação, constatou uma diferença de tratamento entre o paciente e demais usuários do plano, e ponderou que o dano à saúde do paciente estava devidamente caracterizado, uma vez que se trata de um idoso com o quadro de câncer de próstata devidamente comprovado por laudos e biópsias, e que teve o procedimento cirúrgico robótico negado indevidamente pelo plano.
Observou-se que a operadora de saúde possui disponível em sua rede hospitalar a tecnologia robótica, aplicada por meio do equipamento denominado "DaVinci", e que o utiliza para outros pacientes. E que, neste caso, não fazia sentido negar a este paciente idoso o acesso ao método cirúrgico que já é aplicado para outros segurados de planos mais caros.
Ademais, o médico indicou expressamente que a cirurgia robótica é a mais indicada ao caso, em função das características do tumor existente, de forma que não existiria nenhuma outra técnica com superioridade para o caso concreto, em razão do paciente se encontrar em estado de risco de vida. Portanto, o procedimento é o que traria maior possibilidade de cura, com menor possibilidade de sequela, menos chance de sangramento e transfusões sanguíneas e de caráter minimamente invasivo.
Portanto, uma vez que o caso apontado dizia respeito ao fornecimento de um tratamento específico para uma doença para a qual há a previsão de cobertura contratual, e que o próprio plano já o aplica em outros pacientes, é evidente que não caberia ao plano de saúde o poder de definir qual deve ser o tratamento médico fornecido ao paciente, ainda mais considerando-se critérios unicamente financeiros
E na mesma toada, tanto o STJ quanto diversos tribunais estaduais já reconheceram a responsabilidade do plano em fornecer todo o tratamento para o câncer, que é uma enfermidade cuja cobertura securitária deve ser garantida a todo usuário. O plano de saúde presta serviços de saúde pública, sendo, portanto, de relevância pública, conforme o art. 197 da Constituição, de forma que é ilegal estabelecer cláusula contratual abusiva ou restritiva de direito, que dê margem à interpretação equivocada a disposições contratuais, com a intenção de negar o cumprimento de sua obrigação.
Conclui-se, portanto, que mesmo com o STJ tendo estabelecido um posicionamento no famigerado "julgamento do rol da ANS", o Poder Judiciário continua reconhecendo o dever dos planos de saúde de realizarem a cobertura dos mais diversos tratamentos.
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1 STJ, Agravo Interno no REsp 1765668 DF 2018/0236330-5, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJ 29/04/2019
2 TJ/PE, Apelação Cível4863323 PE, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Frederico Ricardo de Almeida Neves, DJ 07/05/2019
3 TJ/PE, Agravo de Instrumento 4094782 PE, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Jones Figueirêdo, DJ 25/02/2016